Violência policial nas prisões em flagrante, presos provisórios misturados com condenados, falta de infraestrutura mínima e domínio de facções criminosas. A descrição da situação de parte dos presídios do País está em uma série de relatórios produzidos pelo Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, órgão da Secretaria de Direitos Humanos do Ministério da Justiça.
O núcleo começou as atividades em 2015 e é composto por 11 peritos independentes, que têm acesso livre aos cerca de 3 mil presídios e outras instalações de privação de liberdade, como hospitais psiquiátricos e abrigos para idosos. Até outubro, 24 unidades de 12 Estados e no Distrito Federal receberam a visita-surpresa dos peritos.
Todos os relatos recebidos pelo órgão são encaminhados ao Ministério Público e às autoridades locais. Se as recomendações não forem atendidas, os Estados não podem solicitar recursos federais dos Fundos Nacional de Segurança Pública, Penitenciário, da Criança e Adolescente e do Idoso.
Para escolher os presídios, os especialistas tiveram como critério denúncias registradas por órgãos federais. Os espaços são visitados por quatro profissionais e o Estado é avisado com um mês de antecedência, mas a unidade a ser visitada é mantida em sigilo, para não comprometer a análise.
A visita à Penitenciária Feminina de Santana, na zona norte de São Paulo, aconteceu, por exemplo, uma semana depois da “festa” comemorativa de aniversário da facção Primeiro Comando da Capital (PCC), no ano passado. Relatos coletados pelos peritos apontam que o Grupo de Intervenção Rápida (GIR) entrou no presídio e desferiu socos, pontapés e ameaças de morte contra as mulheres.
Outra denúncia é que foram lançadas bombas de gás lacrimogêneo, presas foram arrastadas pelo cabelo e até obrigadas a levantar a blusa, “ficando assim expostas partes íntimas, e as que resistiam eram espancadas por cassetetes”. “Nem as idosas e as presas doentes foram poupadas”, diz o texto.
Em visita ao Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico Professor André Teixeira Lima, em Franco da Rocha – unidade de onde 55 internos fugiram após rebelião, em 17 de outubro -, os peritos relataram falta de atividades terapêuticas previstas na legislação. “Durante a visita, as pessoas internadas permaneciam nos pátios das colônias conversando, limpando os quartos, organizando seus pertences, lavando louça ou roupa, etc”.
O relatório também aponta “inúmeros relatos de agressões cometidas por funcionários da instituição, tanto os ligados à segurança da unidade quanto os da área da saúde”, como “agressões verbais, humilhações e espancamentos”.
Um dos relatórios mais recentes, em Rondônia, finalizado no mês passado, aponta superlotação e celas precárias na Casa de Detenção Dr. José Mario Alves da Silva, Urso Branco – unidade para onde foi transferida parte dos presos que participaram do conflito entre as facções PCC e Comando Vermelho (CV), em 17 de outubro, resultando em oito mortes em Porto Velho.
Quando a unidade foi visitada, atendia 667 presos – a capacidade da penitenciária é para 450. “Esse problema, que foi um dos que motivaram as rebeliões anteriores, persiste naquela unidade”, diz o texto.
Para o perito do Mecanismo e advogado Rafael Barreto, a ausência do Estado nos presídios é um dos motivos que expandem a força das facções criminosas. “Observamos que a ausência do Estado é uma constante. Acabamos de voltar de Mato Grosso do Sul e a maior penitenciária do Estado, com 2,3 mil presos, tinha 13 agentes penitenciários. Obviamente vai existir uma dinâmica institucional para além da dinâmica do Estado”, afirma.
Resposta. A Secretaria da Administração Penitenciária de São Paulo (SAP) diz, em nota, que discorda dos resultados do relatório, que traz “uma série de informações equivocadas e inverídicas”. A pasta negou o uso de gás lacrimogêneo pelo GIR na Penitenciária de Santana. Em relação ao Hospital de Custódia, diz que a unidade “utiliza projetos terapêuticos de acordo com as diretrizes da Lei da Reforma Psiquiátrica”.
O Governo de Mato Grosso do Sul disse estar “atento à defasagem de agentes penitenciários” e que finaliza concurso público pelo qual 438 novos servidores serão agregados ao sistema já em janeiro.
Ao Estadão, o secretário de Justiça de Rondônia, Marcos José Rocha dos Santos, disse, por e-mail, que a unidade citada no relatório está sendo “gradualmente” desativada.
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