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22 de Fevereiro de 2025

OPINIÃO Terça-feira, 18 de Fevereiro de 2025, 12:49 - A | A

Terça-feira, 18 de Fevereiro de 2025, 12h:49 - A | A

GAYLUSSAC DANTAS ARAÚJO

Flatus vocis

Intriga-me a tal ponto que, somente aquela Esperança com "e" maiúsculo, que se deve ter justamente na desesperança, poderia me desinclinar da minha tendência natural, em reputar o fenômeno a uma imbecilidade coletiva de classe.

GAYLUSSAC DANTAS ARAÚJO

Muito intrigante é o fenônemo que tenho observado na advocacia brasileira já há quase três décadas.

Intriga-me a tal ponto que, somente aquela Esperança com "e" maiúsculo, que se deve ter justamente na desesperança, poderia me desinclinar da minha tendência natural, em reputar o fenômeno a uma imbecilidade coletiva de classe.

Aliás, I.C.C. (imbecilidade coletiva de classe) seria uma boa sugestão de sigla à O.M.S., em sua catalogação de patologias, se não olvidamos que imbecilidade, antes de ofensa, é termo técnico da medicina para designação de doença mental.

Também me vejo obrigado a descartar a ocorrência de um surto de psicopatia seletiva, mas isso por uma simples questão de probabilidade, já que presentes todos os elementos caracterizadores do transtorno de personalidade antissocial no caso.

Refiro-me à atitude do advogado em patrocinar causas contra sua própria convicção.

A esse respeito, vou preferir sempre cogitar uma hipótese patológica para o fenômeno, por se tratar de algo que vai contra a própria natureza do ser humano.

Ora, o advogado, basicamente trabalha escrevendo ou falando, não sendo muito simples nem uma prática nem outra.

Sempre será trabalhoso e custoso preparar e esmerilhar uma petição ou uma sustentação oral, mesmo que o advogado esteja defendendo aquilo que representa o mais básico de seu conhecimento. Aquilo que, se não reconhecido, lhe causará enorme frustração.

Quanto mais trabalhoso não será, então, se se debruçar sobre um caso e defender o oposto de sua crença, através de um ato claramente desnatural e de verdadeira auto negação?

Soa-me, o patrocínio de causas contra a convicção, como a decretação unilateral, pública e formal da insignificância do causídico e, por consequência, de sua descartabilidade, o que é muito triste de se assistir. Percebe-se isso, tanto na advocacia privada, como na pública.

Custa-me admitir que tal fenômeno não seja fruto de uma patologia, quiçá de uma patologia sobrenatural, porque, do contrário, dever-se-á admitir, por hipótese, motivos desabonadores de toda uma classe.

A estreiteza de minha imaginação me oferece dois motivos cogitáveis. Ou a advocacia brasileira está permeada de pessoas completamente inseguras e temerosas quanto a sua sobrevivência (covardes) ou de pessoas ávidas e sedentas por crescer, a qualquer custo, em sua carreira profissional (canalhas).

Imaginar advogados, privados ou públicos, levantando-se diariamente para tomar seu café da manhã, levar seus filhos à escola e dirigir-se aos seus gabinetes para ali produzir a desprodução, é realmente desalentador.

Por parte da advocacia privada, auxiliar estelionatários em ações que visam dinheiro ou bens de outrem. Quanto aos advogados públicos, contribuir com o confisco, o calote e o abuso de poder.

São exemplos que realçam claramente a descrença geral no direito e na justiça e que decretam uma oposição e desinteligência entre todos os integrantes da trama social, que se vêem autorizados a se dedicarem, exclusivamente, na defesa de seus próprios interesses, sem qualquer imposição do que é certo, legal e justo.

Em retrospectiva, observamos leis, normas e regimentos valendo-se dos mais elementares e nobres princípios para exortar seus destinatários à prática da cidadania, visando o bem comum.

O Código de Ética da Ordem dos Advogado do Brasil, por exemplo, assim dispõe, em seu art. 2º: O advogado, indispensável à administração da Justiça, é defensor do Estado democrático de direito, da cidadania, da moralidade pública, da Justiça e da paz social, subordinando a atividade do seu Ministério Privado à elevada função pública que exerce. Parágrafo único. São deveres do advogado: I – preservar, em sua conduta, a honra, a nobreza e a dignidade da profissão, zelando pelo seu caráter de essencialidade e indispensabilidade; II – atuar com destemor, independência, honestidade, decoro, veracidade, lealdade, dignidade e boa-fé;...V – contribuir para o aprimoramento das instituições, do Direito e das leis; ...VI – estimular a conciliação entre os litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de litígios; VII – aconselhar o cliente a não ingressar em aventura judicial;...

O bacharel em direito presta um juramento, perante o Reitor de sua faculdade, por ocasião de sua colação de grau. Ao receber a carteira profissional, presta outro juramento, perante o presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil.

Nunca se teve notícia que qualquer pessoa tenha prestado tais juramentos sob ameaça, contudo, o que se vê, muito frequentemente, é que as palavras ali pronunciadas não passam de um mero sopro de voz. Flatus vocis.

(*) GAYLUSSAC DANTAS ARAÚJO é advogado em Mato Grosso.

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