Com o presidente Donald Trump no cargo há apenas um mês, o vasto império empresarial de Elon Musk já está se beneficiando – ou agora está em uma posição decididamente mais favorável para isso.
Trump e Musk, o homem mais rico do mundo, a quem o presidente concedeu um poder imenso, têm desmantelado agências federais em todo o governo. Trump demitiu altos funcionários e afastou servidores de carreira. Muitos deles lideravam investigações, processos ou medidas de fiscalização pendentes contra as companhias de Musk. O empresário também se beneficiou da renúncia de reguladores da era Biden, porque isso alterou o controle de agências reguladoras importantes, deixando republicanos mais alinhados com a nova administração no comando desses processos.
De acordo com uma análise feita pelo The New York Times, pelo menos 11 agências federais afetadas por essas mudanças têm mais de 32 investigações em andamento, reclamações pendentes ou ações de fiscalização contra as seis empresas de Musk. As investigações incluem multas da Administração Federal de Aviação (FAA, sigla em inglês) contra a SpaceX, empresa de foguetes de Musk, por violações de segurança, e um processo da Comissão de Valores Mobiliários (SEC, sigla em inglês) que pressiona Musk a pagar ao governo federal possivelmente até US$ 150 milhões, acusando-o de ter violado a legislação federal de valores mobiliários.
Só o Conselho Nacional de Relações Trabalhistas (NLRB, sigla em inglês), agência independente de defesa dos direitos dos trabalhadores, tem 24 investigações sobre as empresas de Musk. Desde janeiro, Trump demitiu três funcionários do órgão, incluindo um membro do conselho, o que paralisou a capacidade deste último de decidir sobre os casos. Até que Trump nomeie novos membros, os processos que dependem de um parecer do conselho não podem avançar.
No Escritório de Proteção Financeira do Consumidor (CFPB, sigla em inglês), um banco de dados público mostra centenas de reclamações contra a Tesla, fabricante de carros elétricos, a maioria relacionada à cobrança de dívidas ou a problemas com empréstimos. O governo Trump ordenou a suspensão de todas as investigações, deixando a agência, pelo menos temporariamente, sem função. O CFPB também seria responsável por regular os novos esforços de Musk para implantar um serviço de pagamentos na rede social X, da qual ele é proprietário.
Musk tem muitos contratos supervisionados por várias agências governamentais – abrangendo os setores espacial, de mídia, financeiro e de segurança viária. Ele e sua equipe agora também ocupam uma posição extraordinária criada por Trump que lhe permite revisar os gastos e o quadro de funcionários de todos os departamentos do poder executivo, por meio de sua iniciativa de corte de custos chamada Departamento de Eficiência Governamental.
Nenhuma das investigações ou ações judiciais envolvendo Musk e suas empresas, pelo menos até agora, foi arquivada de maneira formal desde o início do novo governo. O “Times” também não encontrou indícios de que Musk tenha ordenado diretamente o encerramento ou a paralisação de qualquer investigação contra suas empresas. Mas a instabilidade nas agências federais representa um dos primeiros testes para a ampla gama de conflitos de interesse que Musk trouxe à Casa Branca, incluindo cem contratos com 17 agências federais.
Musk controla seis empresas, incluindo a Tesla, que tem ações na bolsa. É o fundador da SpaceX; da startup de inteligência artificial xAI; da Boring Company, que perfura túneis; e da Neuralink, que desenvolve implantes cerebrais em interface com computadores. Todas são privadas. Também é dono da rede social X, anteriormente conhecida como Twitter. Suas companhias receberam US$ 13 bilhões em contratos nos últimos cinco anos, tornando a SpaceX, que responde por grande parte desse montante, uma das maiores fornecedoras do governo.
Musk tem um histórico longo e conturbado com os órgãos reguladores responsáveis por supervisionar suas empresas. Já chamou os membros da SEC de “canalhas”, e a SpaceX processou o NLRB, argumentando que a agência é “inconstitucional”, depois que esta alegou que a empresa dele havia maltratado e demitido alguns funcionários de maneira ilegal.
Democratas no Congresso e advogados externos especializados em contratos governamentais e ética contestaram a posição de Musk, afirmando que não conseguem identificar um momento na história dos Estados Unidos em que um executivo empresarial com tantas pendências regulatórias e bilhões de dólares em contratos federais tenha tido tanto poder sobre as operações do governo. Recentemente, Trump garantiu que Musk “não está ganhando nada” com essa função. Autoridades da Casa Branca declararam que cabe a Musk monitorar as próprias ações.
Musk, suas empresas e um porta-voz do Departamento de Eficiência Governamental não responderam às solicitações de comentário. Entretanto, o bilionário já defendeu seu envolvimento em contratos do Pentágono e disse estar confiante em que não há conflitos de interesse, porque são os funcionários da SpaceX que enviam as propostas, não ele pessoalmente.
SpaceX, Tesla e segurança
O lançamento do foguete Falcon Heavy pela SpaceX em julho de 2023, que partiu do Centro Espacial Kennedy, na Flórida, foi histórico: a empresa colocou na chamada órbita geoestacionária, a 35.400 quilômetros da Terra, um satélite de dez toneladas, o maior já enviado para essa altitude. Enquanto isso, um conflito entre a SpaceX e a FAA se desenrolava. A agência informou à SpaceX, durante a contagem regressiva para o lançamento, que uma nova instalação construída pela empresa para abastecer os motores do foguete ainda não havia passado por todas as inspeções de segurança exigidas. A SpaceX prosseguiu mesmo assim. A FAA propôs uma multa de US$ 283 mil. Essa decisão, em conjunto com uma segunda multa proposta pela FAA, enfureceu Musk. Depois, ele exigiu a renúncia do chefe da agência, Michael Whitaker.
Musk conseguiu o que queria quando Whitaker, advogado com décadas de experiência na indústria da aviação, renunciou no último dia do governo Biden. Com Trump de volta à Casa Branca, aliados de Musk viram uma oportunidade para revogar as multas propostas pela FAA e pressionar a agência, que é responsável por garantir que os lançamentos de foguetes não coloquem o público em risco nem causem danos excessivos ao ambiente, para acelerar as aprovações da SpaceX.
Mudanças na SEC
As alterações na liderança da SEC, que processou Musk em janeiro, pouco antes do retorno de Trump à Casa Branca, certamente resultarão em um desfecho mais favorável para o empresário. A SEC determinou que Musk pagou pelo menos US$ 150 milhões a menos pelas ações do Twitter, comprado em 2022, antes de assumir formalmente a empresa, por não ter apresentado no prazo legal uma notificação de que já havia adquirido cinco por cento da companhia. Segundo a agência, se esse aviso tivesse sido protocolado, é quase certo que as ações teriam sido valorizadas, aumentando o custo da aquisição. Durante meses, Musk ignorou uma série de tentativas da agência de entrevistá-lo, concordando em responder pessoalmente às perguntas apenas alguns meses antes do fim do governo Biden, o que adiou a investigação.
A SEC é supervisionada por uma comissão de cinco membros, que precisa aprovar processos e acordos. Os dois que são republicanos se opuseram à ação judicial planejada, mas estavam em minoria na época. Agora, com a saída de dois democratas, os republicanos têm maioria, e dois advogados que participaram das deliberações disseram esperar que isso seja resolvido com uma multa modesta.
Direitos trabalhistas
Em duas agências federais de fiscalização dos direitos dos trabalhadores, as ações de Trump têm um impacto direto no império empresarial de Musk, assim como em inúmeras outras companhias com processos em andamento nesses órgãos. As demissões no NLRB e na Comissão para a Igualdade de Oportunidades no Emprego (EEOC, sigla em inglês) significam que nenhuma dessas agências tem quórum suficiente para resolver os casos.
Uma das investigações do NLRB envolve as demissões em massa promovidas pelas empresas de Musk em 2022 na rede social X. Na época, os funcionários do Twitter se reuniram para discutir a situação no ambiente de trabalho, usando a plataforma Slack e o aplicativo de mensagens Signal. A empresa tentou obter acesso às conversas e até monitorou alguns funcionários. O caso está sendo analisado pela equipe do NLRB, mas a atual composição do conselho pode dificultar seu andamento ou impedir que uma decisão contra o X seja aplicada.
Em 2023, a EEOC processou a Tesla separadamente, alegando assédio racial sistemático e “contínuo” contra funcionários negros e retaliação. Embora o caso esteja em andamento, Trump deve nomear novos comissários, o que pode mudar a abordagem da agência dos direitos trabalhistas, e é possível que leve ao arquivamento do processo. Um porta-voz da EEOC afirmou que a agência não comentaria litígios em andamento.
Inspetores demitidos
Na primeira semana de governo, Trump demitiu pelo menos 17 inspetores-gerais, responsáveis por investigar desperdícios e corrupção dentro das próprias agências. A demissão em massa – medida que talvez tenha violado a legislação federal – pode beneficiar Musk.
Entre os inspetores-gerais demitidos estava Phyllis Fong, do Departamento de Agricultura (Usda, sigla em inglês). Sua agência havia iniciado uma investigação em 2022 sobre a Neuralink, startup de implantes cerebrais de Musk, e o inquérito ainda estava em andamento no fim do ano passado. Em dezembro, Musk publicou no X uma carta de seu advogado alegando que a SEC também havia reaberto uma investigação sobre a Neuralink.
Ryan Merkley, diretor de defesa da pesquisa do Comitê de Médicos para Medicina Responsável, organização sem fins lucrativos, disse em entrevista que as duas investigações surgiram depois que a entidade descobriu, em 2021, por meio de uma ação judicial para acesso a documentos públicos, que a Neuralink supostamente maltratara dezenas de macacos usados para testes. Musk negou que tenha havido maus-tratos aos macacos na Neuralink, e a empresa não foi autuada depois de uma inspeção do Usda. O escritório do inspetor-geral do Usda não respondeu aos pedidos de comentário.
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