Nas casas cuiabanas, num dos cantos das salas, o pote de barro com o seu tampo de madeira e junto dele, pendurada num fio, a pedra-ume para purificar a água, retirada das fontes, bicas, chafarizes, poços e rios.
A presença da pedra-ume talvez caracterizasse o medo da população em contrair doenças advindas da água. Em tanques e depósitos domiciliares, lambaris e cascudos foram utilizados como “purificadores” naturais, ingerindo lodo das paredes.
Até inícios do século XX, mesmo com um sistema de abastecimento de água potável moderno atendendo inclusive domicílios de famílias mais ricas, o pote d´água fresca no canto e a pedra-ume continuavam em generalizado uso). A “pedra-Hume demorou-se mais do que se esperava, mas afinal chegou e vão agora as duas barricas de sua encomenda”.
Na virada do século XIX para o XX, ainda se encontrava em residências de Cuiabá o filtro de pedra, que por vezes lembrando enorme seio generoso, arredondado, ia gotejando lento e carinhoso a água cristalina.
As técnicas de purificação da água potável armazenada em potes e similares certamente eram adotadas também em acordo com livros de medicina, mais ou menos vulgarizadores. Estudos recentes têm identificado a presença desses livros em residências da camada letrada da vila e da cidade. Era o caso da Medicina Doméstica, de Guilherme Buchan, que teve várias traduções. Ou de Farmacopéia Lisbonense, de Manuel Joaquim Henriques de Paiva e de Erário Mineral, de Luís Gomes Ferreira.
A implantação de um novo sistema de coleta e distribuição de água potável na cidade de Cuiabá, entre 1882 e 1884, certamente alterou as práticas cotidianas da população urbana.
Somente após 1945 é que o sistema de abastecimento de água potável recebeu tratamento através de produtos químicos: (...) presentemente, só estamos utilizando de cal e sulfato de alumínio. O aparelho de cloro está quebrado há dois anos, sendo pedidas providências a essa Secretaria, segundo informações que nos foram prestadas.
Conforme dona Helena Júlia Muller de Abreu Lima, já falecida, na sua infância e adolescência nas décadas de 30 e 40 (século XX), Cuiabá, apesar de possuir abastecimento público de água potável, não recebia tratamento, sendo este feito nos domicílios.
Recorda que o seu avô, João Pedro de Arruda, tratava a água retirada das bicas da Prainha em latas de 20 litros em sua residência, colocando uma pedra ume amarrada a um barbante no interior do pote e mergulhava e puxava e mergulhava e puxava a pedra durante 3 vezes. Deixava em repouso e, depois retirava cuidadosamente com uma caneca a sujeira para depois beber.
Para o engenheiro° Guilherme Júlio Muller de Abreu Lima, professor aposentado da Universidade Federal de Mato Grosso-UFMT:(...) essa era uma forma de ir tratando a água, ou seja, colocando a pedra de alúmen ia dosando o sulfato de alumínio na água para coagular as partículas coloidais, produtoras de cor e turbidez e depois disso agitava durante algum tempo para flocular – formar flocos suscetíveis de sedimentação, retirando com caneca o sobrenadante do pote, que apresentava aparência melhor, com menor cor e turbidez.
Segundo o engenheiro químico Noé Rafael da Silva, a pedra-ume é um sulfato de alumínio e potássio, cor opaca, com o mesmo princípio ativo do sulfato de alumínio ferroso, cor amarela atualmente usado como coagulante primário nas Estações de Tratamento de Água - ETAs localizadas nos centros urbanos das cidades.
A partir de 1945, apareceram as Estações de Tratamento de Água em Cuiabá – Etas. Em 1970, a Sanemat construiu a Estação de Tratamento de Água, na avenida São Sebastião na capital, pelas mãos do Engº José Brunello Bombana, já falecido.
Em 1975, o eng. José Luiz de Borges Garcia já informava que Cuiabá deveria triplicar as suas fontes de água tratada para uma Cuiabá de 300 anos. Hoje a ETA da São Sebastião ainda é a principal. Há necessidade de planejamento futuro para atender o adensamento da cidade.
Neila Barreto é jornalista, mestre em História e membro da AML e atual presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso.
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